natalia

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Da série: psicose nossa de cada dia


Estava numa correria louca para viajar no feriado. "Não leva a mala grande", aconselhou minha amiga. "Compra uma menorzinha, é mais prática."
Foi o que eu fiz. Comprei uma linda, rosa de bolinhas.
O problema é na hora de arrumar. Porque apesar de deixar sempre pra última hora, como se a tarefa fosse simples, eu não tenho o menor talento para decidir o que levar. Essa coisa de discernimento não é comigo. Quando se trata de bagagem - e não importa se o destino é Paris ou Nova Iguaçu - eu sou completamente inábil. Levo todos os meus cremes: hidratante, esfoliante, anti-rugas, leave-in pro cabelo, creme para as mãos, para os pés, para o rosto - mas sou perfeitamente capaz de esquecer as calcinhas em casa.
De qualquer forma, lá estava eu, terminando a missão mala, correndo contra o tempo, quando impensável aconteceu. Na hora de fechar, num movimento sincronizado dos infernos, o zíper quebrou no mesmo instante em que a alça arrebentou, causando um estado de petrificação nesta que vos fala.
Depois de encarar por alguns segundos aquela cena, não pude conter um grito de ódio e indignação. Chutei aquela merda rosa de bolinhas algumas vezes e, cansada do esforço físico, me contentei em continuar apenas xingando. Por alguma razão, quando estamos com muita, muita raiva, só conseguimos nos lembrar de um número limitado de palavrões. No meu caso, o repertório se resumia a puta-que-pariu-caralho-se-foder-porra, que eu repeti algumas centenas de vezes, antes de começar a etapa do choro.
"É só uma mala", disse minha amiga, bastante assustada.
"Não, não é só uma mala", rebati, chorando. "Era a minha mala, com as minhas coisas."
"Tudo bem, a gente vai lá trocar por outra."
"Eu não quero outra! Eu quero essa!"
"Mas tá toda arrebentada."
"Puta que pariu, mas eu já arrumei tudo, caralho. Deu mó trabalho pra organizar! Se foder, agora eu vou ter que tirar tudo e começar tudo de novo, porra? Quando isso vai acabar? Eu não aguento mais!"
"Isso não é por causa da mala, né?", ela constatou, finalmente.
"Como assim? Claro que é por causa da mala! O vendedor disse que ela era resistente e eu acreditei. Eu sabia que devia ter testado na hora, mas nãão. A idiota aqui confiou no babaca."
"Vamos voltar lá e falar com ele."
"Ele não vai estar lá."
"Como é que você sabe?"
"Porque eu sei. Ele deve estar namorando agora. É o que todos eles fazem depois que eu vou embora. Eles começam a namorar, é uma profecia."
Minha amiga revirou os olhos, e sentou-se ao meu lado, dando tapinhas no meu ombro.
"Se foder, porra", ela disse, em solidariedade.
Depois, no caminho até a loja, passamos por uns camelôs e vimos a mesma mala pela metade do preço. Não era uma imitação. Era exatamente a mesma.
"Tá vendo", disse minha amiga. "Era por isso aí que você tava chorando."
Então me recompus. Foi só ali que percebi que a mala não tinha arrebentado por minha culpa. Ou por culpa do meu azar, do Universo, do Murphy. Ou do vulcão de Eyjafjallajoekull. Nada disso. A mala arrebentou porque era vagabunda e não valia metade do meu investimento.

Deve ser mais ou menos assim com a vida afetiva, não? [2]

24 comentários:

  1. Não só com a sua, pode ter certeza... eu vejo essa cena se repetindo constantemente no meu dia-a-dia.... rs

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  2. Ai que triste essa história! Eu vivo fantasiando o pior quando estou com pressa e, dependendo da força do meu pensamento, acabo conseguindo o que mais temo.

    Eu também deixo para arrumar as malas na última hora e porque a viagem normalmente dura pelo menos alguns meses (aqui da Austrália pro Brasil ou vice-versa) ela vai sempre lotada. Da penúltima vez descobri no aeroporto, ao pesá-la no balcão da companhia aérea, que os 23kg que a mala deveria ter se haviam transformado em 38kg! Imagine a cena: eu abrindo o baú no meio do saguão com todos da fila olhando meus soutiens saltando pra fora enquanto eu troco os sapatos que estou calçando pelas botas que estavam dentro dele e tento achar sacolas para colocar as roupas que vou ter de deixar pra trás. Era tanta alegria que nem daria para explicar!

    E quanto a esquecer coisas de absoluta importância, estou com você nas calcinhas! Passei uma viagem toda (de acampamento, com barraca e tudo) lavando a única que havia levado no chuveiro e secando ao sol enquanto usava o também único par de biquini que tinha na mochila.

    Doces são os tempos em que viajamos, não?

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  3. Na verdade não é por causa da mala e sim dO mala! :D
    Se-foder-porra!

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Adorei o txt quase morri de rir um dia antes de completar 25 anos.

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  6. tá elaborando bem amiga! É isso aí, que calma que esta constatação traz...beijo!

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  7. Sério? sou sua fã!

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  8. Se F%$#&@ P*&%$@ Adorei como sempre....

    Tem vezes que o melhor a fazer é "chutar o pau da barraca" mesmo!

    Beijosss e bom final de semana

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  9. é... USE a outra, a grande!

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  10. Muito engraçado...já fiz parecido...vc não está sozinha rs

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  11. A relação entre a mala e a vida afetiva é 101% verdade!!

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  12. Olha adorei seu texto e gosto de seguir blogs assim, que acrescentam coisas na nossa vida... ri muito com sua história, pq tenho uma dessas em casa (mulher que arruma mala com 12 cremes para cabelo e 12 para o rosto, 400 sandálias e tá indo pra neve ou 6 botas para ir para praia), e vc não é a unica com este vasto limitado repertorio de xingos... eles desopilam são ótimos para aliviar o stress... Mas olha mala vagabunda não dá... mas tenho certeza que as bolinhas fizeram a diferença na hora da compra.... rsrsrs
    bjs

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  13. Bom dia!
    É a primeira vez que entre neste blog e adorei!
    Isso sempre acontece comigo. Zípers!!!!!!
    Ninguem merece! Levam a loucura. Conseguem fazer-nos perder o psicológico.
    Bj

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  14. :) não dá para por tanta coisa necessária, numa mala vagabunda rsrrsrs

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  15. É, compramos malas vagabundas.
    Choramos o dobro e somos deixadas na mão quando mais precisamos ás vezes.
    Em momentos como esse, como não psicotizar!?
    hahahahahaha
    Se foder c-o-m-e-s-t-a-m-e-r-d-a de mala!!!!

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  16. fenomenal!!!!!!!!!!!

    fico pensando cá comigo, deve ser mto libertador escrever essas coisas, natalia. hoje eu precisva ter um adorável, e não um bainha. affffffff

    bjs

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  17. Amei o texto e no final a comparação foi show.
    Amo seus textos, Klein.

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  18. Finalmente alguém escreveu algo que preste sobre relacionamento! N'quer dizer isso para as minhas amigas? Por favor... hein? hein? Elas ficam se lamentando, chorando, tomando remédios... Eu já tentei diversas vezes sentar ao lado delas na cama... já disse sefoderporra outras tantas... mas não adianta... as cenas sempre se repetem... é muita mala sem alça dando defeito porraí!! E meus ouvidos lá... aguentando! Quer dizer... nem sempre. Já despedi algumas delas... com baixa na carteira e o caramba! Todo mundo sabe muito bem... já foi provado por neurocientistas no mundo inteiro que todo relacionamento é uma merda... não vale a celulose do lenço de papel...

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  19. "Foi só ali que percebi que a mala não tinha arrebentado por minha culpa. Ou por culpa do meu azar, do Universo, do Murphy. Ou do vulcão de Eyjafjallajoekull. Nada disso. A mala arrebentou porque era vagabunda e não valia metade do meu investimento."

    Garota, esse é o melhor blog que eu já li! Sou tão psicótica quanto você. Me identifiquei com todos os textos. Heuehue

    Mas nesse você chegou no X da questão. É isso aí com os relacionamentos. Eles acabam, e a gente acha que a culpa ou é nossa, ou é do universo que conspira contra nós. Mas na maioria das vezes o problema são simplesmente as pessoas que não merecem o valor que a gente dá pra elas.

    Por mais clichê e piegas, a real é que as pessoas vão nos tratar como a gente permite que elas tratem, né... E se a gente tende a se dar mal, é mais porque a gente se sabota escolhendo as pessoas que não valem o que a gente vale. Ou pior, porque a gente mesmo ainda não sabe o quanto vale e não se permite ser bem tratado!

    Hahaha Muito auto-ajuda esse meu comentário! Mas é isso aí, temos que ter consciência de quanto vale a nossa mala. Heuhuehe

    Adorei seu blog! Sucesso!

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  20. Como diria Lily Alen, "It's not me. it's you". Haha.

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  21. pois é... eu tive algumas malas pequenas. tentei até usar as médias para viagens curtas, mas é inútil. agora resolvi investir em mala grande, levíssima, e com várias rodinhas que fazem com que ela vá deslizando suavemente à minha frente com um leve toque. tipo, mala que você não precisa carregar ou empurrar. mala auto suficiente. com várias divisórias. com espaço pra mim em sua vida, e pras minhas manias de levar roupas próprias para o clima do destino, e algumas opções para os imprevistos, e sapatos para cada ocasião, e uma necessaire gigante que é quase uma malinha, com várias coisas indispensáveis, como cremes de mão, xampus, leave-in, lenço umedecido e assento de vaso sanitário. mala confiável, que não vai abrindo o zíper assim por qualquer coisa. e que aguenta o tranco das viagens mais longas. e com extensão na frente, pra quando eu quiser mais.

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