natalia

domingo, 5 de abril de 2009

Nevermore


Nesses últimos dias, acabei confirmando uma velha suspeita: a de que eu escrevo mais quando estou insatisfeita com a conjuntura do universo.
Depois de ser chamada de pudica e autocentrada , terminei a semana tendo que lidar com a Síndrome de Mestre dos Magos dos outros.
Pra quem não sabe, a SMM é um problema sério que atinge 98,8% da população masculina do mundo. Ela se manifesta em intervalos não regulares e suas causas permanecem indefinidas. Os primeiros sintomas surgem logo no começo da semana e se agravam na sexta-feira, podendo ou não se estender até domingo. O sintoma mais característico é o déficit do coeficiente de presença que, em seu estágio mais avançado, pode chegar à invisibilidade total.
Para não ser uma vítima passiva dessa síndrome - que alcança o auge do incômodo no sábado à noite -decidi sair para beber com um grupo de amigos.
Mesa grande, mas acolhedora. Apenas rostos familiares. Onze lugares. Ou, em boa matemática, cinco casais e eu. Joinha.
Mas decidi ignorar o caráter ímpar da reunião. Devia ter sido a única a perceber, as pessoas tinham mais o que pensar, claro. Já disse que não sou autocentrada.
- Olha, só tem casal na mesa! - concluiu precipitadamente um dos convivas, enquanto seu olhar percorria as cadeiras - Ah, menos a Natalia!
Pausa.
Esse é um daqueles momentos da vida que só podem ser definidos pela junção de três palavras: tá-de-sacanagem. Nada mais.
Olhei para o garçom e apontei para a garrafa de guaraná vazia a minha frente. Ele fez que entendeu e entrou no bar. Mas em vez de voltar com meu refrigerante, ele apareceu com mais duas garrafas de cerveja.
Novamente, olhei para o garçom e apontei para a a garrafa de guaraná. E novamente ele demonstrou ter entendido o que eu queria.
Imaginem a minha surpresa quando ele saiu com bebidas para as mesas ao lado! Como se todo mundo merecesse ser servido, menos eu!
- Ei! Ei! - chamei - Por que você não trouxe meu guaraná?
- Ué, você pediu?
- Sim, eu pedi! Eu fiz assim, te mostrei - disse, apontando para a garrafa.
- Então você não pediu, você apontou.
- Dá no mesmo! Se eu tô apontando é porque eu quero, óbvio!
- Discordo.
- Discorda? Como assim discorda? Você não acha que ficou subentendido?
- Sim, minha querida, mas eu não posso operar pelo subentendido. Se você não virar pra mim e falar o que você quer, eu não vou ficar supondo.
- Olha só, meu querido, não vem dar uma de esperto pra cima de mim não, tá! Você sabe muito bem que eu queria esse guaraná, não tenta inverter a situação! - esbravejei, enquanto ele me olhava um pouco assustado - Sabe o que você é? Você é um vacilão! Seu vacilão!
- Eu posso trazer o guaraná agora.
- Agora eu não quero mais. Vacilão! Tá achando o quê? Eu consigo guaraná em qualquer esquina! Tá cheio de garçom por aí querendo me servir! Eu sou a rainha do guaraná!
(silêncio geral)
- Esquece, só traz uma cerveja - concluí.
*
Não falo com portadores da Síndrome de Mestre dos Magos. Sou preconceituosa. Mas se pudesse, mandaria um corvo treinado para a porta dos seus quartos, ao cair da madrugada, para que ele dissesse em alto e bom som, "Nevermore".

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